terça-feira, 25 de dezembro de 2012

A JANELA DE ALTINA REGINA BEZERRA

De pele muito clara, estatura um pouco baixa, cabelos escuros e anelados à altura dos ombros, rosto redondo, corpo cheio com formas bem definidas e sorriso tímido e ingênuo: foi o que encantou e apaixonou o jovem Ticão. Assim era Altina Regina Bezerra que nasceu em Mossoró no ano de 1902, filha de Antonio José de Castro e Regina Maria Bezerra, como consta do seu assento de casamento. As informações colhidas sobre sua origem são imprecisas. Alguns afirmam que os pais eram de Mossoró e foram embora para o Estado do Pará. Outros dizem que ficou órfã muito cedo e foi criada por umas moças solteironas, da família Alves, que cuidavam da Igreja de Santa Luzia e moravam no centro da cidade. A lembrança de um dos filhos de Altina registra apenas os apelidos das beatas: Tita, Lola, Leopoldina, Delva que eram irmãs de uma figura muito conhecida na cidade: Zé Bilau. A Tita, segundo informação colhida em livro de Raimundo Nonato, chamava-se Francisca Alves, era professora e ensinava em casa. Ainda menina, Altina foi morar no sítio Santana em casa de Vicente Faustino de Medeiros, tio de Francisco Tibúrcio de Medeiros que viria a ser seu marido e pai dos seus filhos. Ali em meio ao trabalho doméstico, observando da janela o pequeno mundo do Sítio Santana, Altina viu o moço Francisco Tibúrcio de Medeiros (Tico Faustino para os mais próximos) com quem iniciou uma amizade seguida de namoro que resultou em casamento "fugido". Numa época em que o consentimento dos mais velhos era importante para abençoar as uniões, o namoro com Altina não recebeu a necessária aprovação dos familiares de “Tico”, provavelmente por ser uma moça muito pobre e sem pais, que vivia de favor na casa de terceiros e, talvez, por acalentarem outra expectativa para o jovem filho, com um casamento mais vantajoso para o grupo familiar. Por outro lado, havia a possibilidade de Altina ter um casamento arranjado com um homem da comunidade bem mais velho, talvez viúvo, deixando de ser um fardo para os que a acolheram. Assim, o namoro não aprovado encorajou o rapto de Altina pelo seu apaixonado pretendente. O rapto da moça pelo seu pretendente era fato comum naquela época, quando o namoro não era aprovado pelos pais. O rapto era consentido pela moça, sob promessa de casamento feita pelo seu raptor. Os costumes de então, determinavam que o raptor não poderia ter relações mais íntimas com a moça raptada, devendo “depositá-la” em casa de uma pessoa de responsabilidade, na localidade mais próxima da sua residência. Conta a sua filha Antonia que ouviu a mãe relatar que Francisco Tiburcio um dia lhe perguntou se queria casar com ele e ela, reconhecendo que na condição de órfã, vivendo de favor na casa de parentes, só teria um lugar efetivamente seu, se casasse, não pensou duas vezes: aceitou a proposta e o convite para fugir, sob promessa de casamento. No dia acertado, Tico Faustino veio busca-la trazendo duas testemunhas e os cavalos para que pudessem chegar à Igreja em Mossoró. Segundo relato de José Vicente de Medeiros, filho de Vicente Faustino de Medeiros em cuja casa morava Altina, “no dia aprazado para a fuga, Tico encostou o cavalo no tronco de um juazeiro que havia ao pé da cerca que circundava um terreno na localidade de Curral de Baixo. Ali junto com as testemunhas, esperou que Altina se aproximasse, para que pudessem se dirigir a Mossoró. O jovem Tico conduzia o cavalo e ela montada na garupa, de banda, a cabeça amarrada com um lenço, ambos com o propósito de ficarem juntos e serem felizes”.Altina mandou avisar o fato à família que lhe abrigava, e no dia seguinte, sem festas e somente com duas testemunhas, foi realizado o casamento, situação que foi facilitada pela intervenção do Juiz de Paz da cidade. A cerimônia foi celebrada no dia 4 de março de 1922, na Matriz de Santa Luzia, sem festas e sem convidados. À época ela contava 19 anos e o noivo tinha 23 anos. O ato religioso foi oficiado pelo Padre Elesbão Gurgel e testemunhado por Vicente Faustino Sobrinho e Vicente Geraldo, ambos residentes no Sítio Santana onde residiam os noivos e seus familiares. A sua vida familiar de Altina e Tico era muito simples e pobre: os afazeres domésticos, a criação dos filhos, a atenção ao marido e alguns serviços de costura, pois ela confeccionava a roupa dos filhos e ainda conseguia ganhar alguns trocados fazendo pequenos serviços de remontes e costura para a vizinhança. Talvez por ter contrariado os interesses da família do marido, não teve nenhuma ajuda nas dificuldades que passou para garantir a sobrevivência dos sete filhos. Ficou viúva no dia 8 de julho de 1933, aos 31 anos de idade e com sete filhos todos menores. Na época moravam numa casa no bairro Boa Vista, em Mossoró, próximo ao Matadouro Público. O marido veio a falecer em decorrência de complicações de sarampo, no Hospital de Caridade de Mossoró. Com os filhos todos pequenos e sem a força do marido, Altina enfrentou muitas dificuldades. Casou-se em segundas núpcias com o viúvo Francisco Epifanio de Melo (1899 – 1961), conhecido como "Chico Epifanio", filho de Manoel Epifanio de Melo e Delmira Maria da Conceição. Chico Epifanio foi casado, anteriormente, com Maria Luiza da Conceição e trouxe para a responsabilidde de Altina, dois filhos do casamento anterior: Raimundo Epifanio de Souza e José Epifanio. Da união matrimonial de Altina com Chico Epifanio, nasceu Vicente Epifanio em 1935. Três anos após, Altina teve uma outra gravidez que resultou num parto muito complicado, tendo o filho nascido morto. Após o fato, a família mudou-se para o Bom Jesus, onde Altina engravidou, novamente, no inicio de 1941, com parto ocorrido em outubro do mesmo ano e nascimento de Ieda. A saúde já debilitada e as complicações do parto – provavelmente eclampsia – levaram Altina a óbito e a pequena criança, também com saúde frágil, mesmo sob os cuidados de José da Rocha e sua mulher Laurinha, ele sobrinho de Chico Epifanio, não sobreviveu por muito tempo, falecendo aos seis meses de vida. Se o casamento com Tico Faustino transcorreu feliz dentro da grande pobreza da família, o mesmo não ocorreu com Chico Epifanio, de quem chegou a se separar mais de uma vez. Faleceu na manhã do dia 28 de outubro de 1941, aos 39 anos de idade, em sua residência localizada na estrada que liga Mossoró ao Sítio Bom Jesus onde morava com o segundo marido, Francisco Epifânio. Na véspera havia dado à luz uma menina, e em decorrência do parto veio a falecer. Os vizinhos mais próximos na localidade – Cidinho casado com Liquinha e Armando casado com Adélia, estiveram presentes na última hora de Altina. O seu óbito foi declarado por Armando Leite de Souza, um vizinho do Sítio Bom Jesus, e lavrado sob nº 7989, no Livro C-11, fls. 160 v e 161, no 1º Cartório de Mossoró. Ao falecer deixou nove filhos, dos quais apenas o mais velho tinha 18 anos, sendo os demais menores: Manoel, Luiz, Dionísio (18), Rubens (17), Antonia (13), Maria (11), Francisca das Chagas (8), Vicente (6) e Ieda (um dia). Foi sepultada no Cemitério de São Sebastião, em Mossoró, no dia seguinte ao do falecimento.